A Promessa - Capitulo 9

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                                                                       Capitulo 9
  Descobri que as experiências mais significativas de nossa vida raramente ocorrem quando as esperamos, e muito frequentemente quando nem sequer estamos prestando atenção.
                                                                                        Diário de Lua Maria Blanco
  A primeira vez que o vi foi no Natal de 1989. Como cantara Bing Crosby, era um Natal branco. Na verdade, estava mais para um Natal desbotado. Quase oitenta centímetros de neve pesada caíram durante a noite, e continuava caindo, com ventos fortes esculpindo a nave na beira das estradas, com montículos ondulantes de um metro de altura que pareciam ondas congeladas. O rádio afirmava que mais de cinco mil lares na cidade estavam sem luz. Luana e eu fazíamos parte dos afortunados que ainda tinham energia e um fogo reconfortante em nosso forno á lenha.
  Nossa árvore de Natal se parecia com o meu interior: pequena, esparsa, seca e com poucas luzes. De fato, sentia-me feia, por dentro e por fora. já fora bonita, ou ao menos este parecia ser o consenso, mas, ultimamente, não estava muito. Sentia-me esgotada e humilhada, como velhos  tênis de corrida. Passando por poucas e boas, minha mãe costumava dizer. Hoje me soa bobo, mas tinha apenas vinte anos  e já me sentia velha. Era jovem demais para me sentir tão velha.
  Se estivesse sozinha, teria apenas ignorado a temporada de festas, mas Luana realmente precisava delas, e Melanie não me deixaria em paz tão facilmente. Comemoramos o dia de Ação de Graças com sua familia. No sábado seguinte, em um esforço para entrar no clima, Luana e eu montamos e decoramos a árvore. Enfeitamos nozes com purpurina e as amarramos com um fio. Também fizemos flocos de neve com papel.
  O dinheiro andava curto, mas me esforcei para conseguir o que Luana  queria, um Srip-lt, um conjunto de livros do Baby-Sitters club, e seu maior presente, uma boneca da American girl. Ela soltou gritinhos quando abriu o pacote da boneca:
- Olhe, mamãe, o que o papai Noel trouxe!
- Que bonita. Qual é o nome dela?
- Molly - Abriu o pequeno medalhão pendurado no pescoço da boneca. - Podemos colocar uma foto aqui dentro?
Sorri
- Como vc adivinhou que era para colocar uma foto ai?
- Todo mundo sabe disso.
- Desculpe. vamos colocar uma foto sua?
- Não do papai.
  Ela estava brincando com sua boneca havia meia hora, quando perguntou:
- Mamãe, por que o papai Noel não trouxe nada para vc?
- Bem - falei -, eu não precisava de nada, então pedi ao papai Noel para levar presentes a uma boa menininha que precisasse.
- O papai Noel não tem presente para todo mundo?
Como ela ficou tão esperta?
- Este ano não. Acho que estavam com brinquedos em falta no polo Norte.
Pude vê-la entretida naquele dilema. por fim, ela disse:
- Então vou pedir a jesus que traga alguma coisa para vc.
Sorri.
- O que vai pedir pra ele me trazer?
- Alguém para cuidar de vc.
  Cada coisa que as crianças dizem, os adultos costumam afirmar. Não sabia como reagir a isso, por isso, apenas mudei de assunto.
- Está com fome?
 Fez que sim
- Vamos comer bolinhos?
- Vamos, sim. Como prometi.
  Uma semana antes, perguntei a Luana o que ela queria para o café da manhã de Natal. Ela não hesitou. Bolinhos de uva-do-monte feitos com leite de manteiga eram uma criação nossa.
  Fui até a cozinha e comecei a separar os ingredientes quando percebi que me esquecera de comprar o leite de manteiga. Eu podia ter usado leite comum, ou mesmo servido um pouco de cereal matinal em vez dos bolinhos - com o tempo do jeito que estava, isso teria sido mais prudente a fazer - mas depois de tudo que Luana passara naquele ano, não queria negar a ela o que estava ao meu alcance.
- Precisamos ir até o mercado - disse. Vesti um sobre tudo, agasalhei Luana, e fui de carro ao único lugar aberto naquela manhã de Natal - uma loja de conveniência distante cerca de um quilômetro e meio de casa.
Talvez tenha sido o acaso, ou talvez uma resposta ás preces de Luana, mas foi ali que o encontrei pela primeira vez.
Quando chegamos á loja, falei para Luana:
- Querida, espere aqui no carro. volto em um minuto.
- Vc compra chiclete?
Sorri.
- Claro.
  Estava tirando a neve das minhas botas quando entrei na loja. por isso não a vi a princípio. Estava de pé, nos fundos, bebericando uma xícara de café com espuma, fitando-me deliberadamente.
                                                                                   Continua....

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