O Poderoso Aguiar | 51º Capítulo

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O Poderoso Aguiar
51º Capítulo – Astúcia

Pov Lua

Entrei no quarto vestindo apenas a camisola preta enquanto secava meus cabelos com a toalha. O relógio anunciava pouco mais de onze da noite, mas incrivelmente eu não sentia cansaço. Incrivelmente nada. Eu já estava tão acostumada a esse ritmo louco que muitas vezes não me sentia mesmo cansada. Agora eu entendia meu marido. Entendia aquele gás todo que ele tinha… nunca parava. Parecia que aquilo se infiltrava em nossas veias, espalhando-se pelo organismo e é o que nos mantinha vivos. Como ele mesmo já disse várias vezes a máfia estava em meu sangue, nasci pra isso. Agora eu tinha certeza.

Joguei a toalha sobre a poltrona e me aproximei da cama, observada pelos olhos astutos do meu marido. Arthur estava recostado na cabeceira da cama, vestido apenas com a boxer preta. Os braços cruzados em frente ao peito deixavam-no ainda mais forte, seus músculos de destacando. Suspirei jogando-me ao seu lado.

– O que foi?
– Nada.
– E esse suspiro?
– Apreciando meu marido, não posso?

Ele não respondeu, apenas abriu os braços puxando-me para o seu peito. Seu hálito quente ricocheteou em meu pescoço fazendo-me estremecer. Estava naqueles dias e a impossibilidade de fazer amor com ele fazia com apenas o contato com sua pele instigasse minha libido. O que aliás, não era de se espantar: isso sempre foi e creio que sempre seria assim.

– Nem vou perguntar se está cansada porque já sei a resposta.
– Convivência com o senhor meu marido.
– Foi tudo bem lá?
– Sim. Conferimos a mercadoria rapidamente. Tudo nos conformes como sempre. E lá com você? Deu tudo certo?
– Sim. Parece que finalmente aqueles trastes pegaram meu ritmo.

Agora era assim. Arthur partia para um lado… eu para o outro. Cada um cuidando de uma parte dos negócios, mas tudo interligado. Estávamos assim há um ano e meio, desde a execução de Victória. Ainda não me conformava por Arthur não ter mandado a cabeça dela de presente para Dom Matteo e sim desovado o corpo em um buraco qualquer. Desde então… silêncio. Dom Matteo simplesmente desapareceu. Arthur e seus homens vasculharam cada canto desse país e nada. Alguns dos comparsas dele ainda estavam presos e sequer sabiam da metade das coisas que aconteceram desde quando Dom Matteo escapou da prisão. Por isso mesmo Arthur estava cada dia mais ranzinza. Tinha, é óbvio, seus momentos de marido apaixonado e pai dedicado. Mas quando o assunto era sobre negócios estava sempre com o pavio curto. Era coice pra todo lado.

Eu resolvi voltar a estudar. Longe de mim parecer burra na frente de Arthur. Então minhas manhãs eram tomadas pelo estudo. Somente depois de metade da tarde eu me envolvia com os negócios.

– Deu o remédio pra Lunna? – Ele rolou os olhos.
– Fez um drama como sempre. Sério Lua… essa menina puxou a você.
– Deixe de conversa Arthur… é tão marrenta quanto você.

Sorri, pensando em nossos filhos a poucos meses de completar três anos. A personalidade dos dois se mantinha a mesma… exatamente como imaginei que seriam. John bem calmo… e Lunna um furacão. Tanto que com apenas dois anos e meio já estava com o braço enfaixado, resultado de uma queda de um banco alto. Realmente ela dava canseira nas babás.

– Vou fingir que não ouvi seu atrevimento. – Eu ri e me aconcheguei mais a ele, deslizando minhas unhas pelo abdômen bem definido.
– Amanhã sairemos cedo não é?
– Sim, mais do que o normal.
– Está ansioso?
– Não.

Acreditei nele. Sua voz era firme e convincente. Apesar de ter aprendido a ser durona, confesso que eu estava meio apreensiva. Era uma missão importante e não poderíamos falhar. Eu fiquei lisonjeada por ver a confiança que Arthur depositava em mim. Eu conferia os carregamentos, negociava com pessoas que queriam segurança, mas nunca tinha participado de um “assalto”. Nem sei se poderia dizer essa palavra, afinal estávamos apenas pagando com a mesma moeda. Ha uns três meses um carregamento nosso foi roubado e agora Arthur queria ir à forra. E isso já era de se esperar, óbvio. Quando perguntei se poderia participar, foi meio na brincadeira. Não tinha esperanças de ver Arthur cedendo. Mas foi uma surpresa e tanto quando ele disse que seria um prazer ter sua esposa ao seu lado.

Se eu fosse louca o bastante para duvidar do nosso amor e da nossa cumplicidade… essa seria uma prova. Estávamos mais unidos do que nunca. Arthur confiava cegamente em mim e eu nele.

– Eu estou.
– Não precisa disso. Você é perfeita em tudo. Já disse que você nasceu pra isso Lua.
– Aprendi muito com você.
– E aprendeu rápido. Não vê há quanto tempo eu luto com o Chay e o Bernardo?
– Isso faz parte da personalidade deles Arthur. Eu sempre fui meio topetuda mesmo. – Ele riu e beijou minha cabeça.
– E eu não sei? E eles sempre foram meio molengas. Mas agora parece que entraram na linha. – Ficamos em silêncio um tempo, apenas o som da nossa respiração se fazia ouvir no quarto.
– Sophia vai dar conta de ficar com as crianças?
– Claro que sim. Além do mais Glenda estará aqui.
– Sei não… Sophia vive desmaiando e vomitando.
– Mas ela já está melhorando. Foi só no começo. Eu também tive alguns enjoos.
– Sim, mas você sempre foi mais forte que Sophia. E além disso não tinha uma espoleta feito Lunna para tomar conta.
– Isso é verdade.

Sophia estava entrando no terceiro mês de gestação, sendo que descobriu a gravidez há menos de um mês. Teve muita vertigem e enjoos fortes, mas agora já estava bem melhor. Ainda assim dava conta de ajudar a cuidar de Lunna e John.

– Vamos dormir? – Arthur perguntou quando não segurei um bocejo.
– Acho que agora o sono está querendo me dominar.
– Isso é falta do chazinho do Arthur. Se tivesse tomado sua dose diária não estaria com sono.
– Convencido.

Falei escorregando meu corpo para o lado. Arthur também se deitou e como sempre passou os braços em volta da minha cintura. Sua boca procurou a minha e eu não me contive, gemendo e enlaçando meu pescoço enquanto colava meu corpo ao dele. Ele riu apertando a mão pouco acima da minha bunda, mas se afastando em seguida.

– Foi só um beijo de boa noite sua safada.
– Eu sei disso ok? – Falei fechando os olhos, um pouco aborrecida. Ele riu alto e beijou minhas pálpebras fechadas.
– Boa noite, amor.
– Boa noite, Arthur.

Eu não sei… ou eu estava muito cansada e não tinha percebido ou então a noite realmente passou muito rápido. Acordei sobressaltada, nem sei por que e olhei para o lado. Apenas a luz fraca do banheiro estava acesa. Arthur estava de pé vestindo a camisa. Mesmo de costas o bandido percebeu que eu estava acordada.

– Se continuar nessa preguiça vai ficar pra trás.
– Preguiça… por que não me acordou?
– Hanhã… vai nessa. Não tenho culpa se não tem responsabilidade.
– Não vou responder. Não quero briga. Posso tomar banho né?
– Claro. Tem que tirar essa marca de baba do rosto.
– Arthur! Eu não babo enquanto durmo.
– Se você diz…

Eu bufei e sai batendo o pé até o banheiro, ouvindo sua risada atrás de mim. Acordou cheio de graça, o maldito. Tomei um banho demorado, satisfeita em verificar que finalmente minhas regras já tinham dado adeus. Não aguentava mais me deitar ao lado de Arthur sem ao menos poder toca-lo.

Na noite anterior não me lembrei de perguntar a respeito do Micael. Sophia iria fazer sua consulta e Micael queria estar com ela. Só queria ver a resposta de Arthur… debochado do jeito que era… duvidava que fosse permitir.

Quando sai do banho ele verificava alguma coisa no notebook e nem me olhou. Comecei a me vestir enquanto puxava assunto com ele.

– Micael ficará com Sophia não é?
– Não iremos para um parque de diversões Lua. Preciso de todos os meus homens. – Fechou o notebook, calçou os sapatos e pegou a gravata. Eu já tinha me acostumado a me vestir rápido, principalmente porque Arthur não era o rei da paciência.
– Nós temos número suficiente de homens.

Ele começou a assoviar uma música que eu odiava. Ontem à noite ele estava tão maleável que pensei que não criaria problemas. Idiota que sou… sempre me esqueço que Arthur é bipolar. Fiquei em silêncio enquanto penteava meus cabelos.

Cruzei meus braços em frente ao peito enquanto o observava ajeitar a gravata em frente ao espelho. Como sempre fazia quando queria ignorar um assunto… Arthur sequer me olhava. Continuava assoviando aquela música irritante, o que era discrepante se fosse olhar sua expressão carrancuda.

– Arthur, pelo amor de Deus… Micael não irá fazer falta. Temos muitos homens. Sophia quer que ele a acompanhe ao médico. – Ele deu aquele odioso sorriso debochado.
– Ela está com medinho?
– Por que? Você estava quando me acompanhava? – Seu olhar se fechou em fenda através do espelho, mas ele não me respondeu. – Sophia só está… assustada. Não imaginou uma gravidez tão rápida.
– Hanhã… fica trepando sem se prevenir e queria o quê? Quem manda dar o salto maior que a perna? – Ele se virou ficando frente a frente comigo. Entretanto toda sua imponência não me fez desistir.
– Você é muito grosso, Arthur.
– Sou mesmo. E você adora sentir essa grossura dentro da sua boc…
– PODE PARAR AÍ. Além de grosso é mal humorado. Só porque não fizemos sexo na noite passada? – Ele apontou o dedo para minha virilha, o que quase me fez rir.
– Pode dar um jeito nessa porra de menstruação. Mulher gostosa e ainda minha deveria vir de fábrica sem esse acessório. Cinco dias… CINCO! Não bastava um? –
Eu explodi numa gargalhada. Ainda não tinha me acostumado ao mal humor dele quando ficava tantos dias sem sexo comigo. O atrevido ainda me imitou. – Só por que não fizemos sexo na noite passada? Dissimulada…. na noite passada e mais quatro.
– Hoje já não há mais nenhum vestígio.

Seu olhar matador fixou-se no meu e ele se aproximou lentamente… aquele andar que mais parecia um leopardo cercando sua presa. Suas mãos desfizeram o nó da gravata e após retira-la ele passou-a pelo meu pescoço e me puxou, meu peito batendo de encontro ao dele. Eu já deveria estar acostumada, mas minhas pernas tremeram quando seu cheiro de macho alfa ficou ainda mais pronunciado… pronto para me abater. Mas eu sabia que ele não poderia se atrasar agora. Tentei… em vão…  Distrai-lo.

– Arthur… e Sophia? – Ele enrolou a gravata na mão, puxando meu rosto até o dele.
– E eu lá quero saber daquela anã? A única coisa pequena que minha mente consegue vislumbrar agora é sua boceta Lua. E vou te dizer hein? Estou com tanta sede que sou capaz de sugar todo e qualquer líquido do seu corpo.

Um gemido alto e prolongado foi minha resposta. Aliás… era a única resposta que meu corpo conseguia dar a ele nessas ocasiões. Todo e qualquer pensamento desapareceu como que por encanto quando sua boca devorou a minha. Eu nunca lutava contra ele… não seria agora.

– Cacete… calma aí, Arthur. A culpa é toda sua, sabe disso.
– Minha? Sou eu que menstruo todo mês e te deixo na seca? E eu fui rápido hein? Pode ir se preparando para logo mais à noite. – Estremeci visivelmente e ele riu. – Safada… adora isso e se faz de ofendida.
– Ah cala a boca. Micael está dispensado então não é?
– Fazer o que né? Não sabe controlar o pau. Agora tem que ir fazer papel de pai.
– Não seja escroto, Arthur. Em matéria de filhos você não é assim e sabe muito bem disso.
– Sim senhora Aguiar. Agora anda logo senão nada dará certo.

Falou já saindo do quarto e fui correndo atrás, ajeitando a arma presa na altura da minha coxa. Antes passamos no quarto das crianças que felizmente dormiam e depois saímos. Nesse tempo Arthur ligou para Micael e avisou que estaria dispensado.

Seguimos em direção a estrada um tanto deserta onde nos encontramos com os rapazes. Arthur repassou todos os passos que seguiríamos até que finalmente tomamos nossa posição. Obviamente ele fez questão que eu ficasse ao lado dele. Passou um dos braços sobre meu ombro.

– Hora da diversão querida.
– Serei recompensada por um bom trabalho?
– Claro que sim. Será recompensada com uma longa e deliciosa foda.

Não poderia existir estímulo melhor que esse.

Pov Arthur

Joguei meu corpo cansado na poltrona de couro, fechei os olhos e girei, tentando ao menos descansar as pálpebras. Antes nem era cansaço físico, era mais o cansaço mental. Entretanto agora uma coisa refletia na outra. Meu corpo começava a reclamar das noites mal dormidas. Isso vinha de longa data, mais especificamente desde o dia em que matamos a vagabunda da Victória. E obviamente não era consciência pesada, mas sim uma raiva intensa por ter deixado Dom Matteo escapar com vida. O pior de tudo era aquela sensação inquietante de que ele estava bem próximo. Era como se o olhar dele estivesse em nós o tempo todo.

Felizmente a segurança da minha família chegou ao ponto que eu queria. Quanto a isso eu não temia. Meu negócio era o ódio mesmo. Principalmente quando Joseph começava a falar da avó. John e Lunna são praticamente bebês, então com o tempo pararam de chamar por Cláudia. Mas Joseph ainda sofria a ausência dela mesmo depois de quase dois anos.

Fora isso, posso dizer que minha vida está como deveria ser. Lua estava cada vez mais infiltrada nos negócios e eu jamais poderia dizer que ela não é boa. Forte e destemida, causava tanto medo quanto eu. Ainda assim não perdia seu jeitinho feminino de ser. Acredito que sua entrada definitiva nos negócios tenha contribuído para que Bernardo e Chay também tomassem jeito. Estavam mais durões, exatamente como eu precisava.

Micael andava meio manteiga, afinal seria pai. Sorri ao me lembrar da anã. Eu seria tio. Claro que gostava de pegar no pé dela, mas ela sequer fazia ideia do quanto eu estava feliz com sua gravidez. Ela estava feliz e isso bastava para que eu me sentisse bem.

Estiquei os braços e passei a mão no rosto no exato momento em que a porta do escritório foi aberta. Lua acabava de entrar com uma xícara de café fumegante. Incrível como ela quase sempre adivinhava meus pensamentos.

– Trouxe um café, embora eu ache que você deveria descansar um pouco.
– Obrigado. Farei isso. Mas antes preciso analisar uns papéis.
– Eu sei que não dormiu bem essa noite. Estava inquieto. Pensei que a “missão” de ontem o deixaria mais relaxado.
– E deixou. Pegar aquela carga, pagando com a mesma moeda me fez um bem enorme. Sem contar que você esteve fantástica. – Sorri ao ver seu rosto vermelho de vergonha. Seu rubor era uma coisa que jamais deixaria de existir, e eu adorava isso.
– Você me deixa sem graça às vezes.
– Mas é sério. – Bebi um pouco do café e inclinei meu corpo em direção a ela.
– Ver um homem daquele tamanho, deitado, praticamente tremendo de medo de você com a arma apontada e o pé sobre ele não tem preço Lua. – Ela riu e balançou a cabeça.
– Aprendi tudo com você.
– E muito bem por sinal.
– Mas não mude de assunto. Aproveite que temos o dia livre hoje e descanse.
– E a senhora Aguiar vai fazer o quê?
– Vou sair com a Sophia. Comprar algumas coisas para o enxoval.
– As crianças ficam não é?
– Claro. Imagine Lunna numa loja comigo.

Eu ri, balançando a cabeça. Nossa filha estava cada vez mais levada. Era energia demais para uma criança de apenas dois anos. Tanta peraltice resultou numa queda e o bracinho enfaixado. E mesmo assim as estripulias não paravam. John ao contrário continuava sempre calmo. Ficava horas sentado brincando ou vendo seus desenhos favoritos.

– Bom… eu vou lá. Prometo não me demorar.

Puxei Lua para o meu colo, minha mão subindo e se enfiando em seus cabelos. Passei a língua em seus lábios antes de repuxa-los com meus dentes. Em seguida quase engoli sua boca, minha língua atrevida já procurando a dela. Lua gemeu baixinho, agarrando meus cabelos também e rebolou levemente em meu colo. Sorri ainda beijando-a. Era sempre assim… sempre pronta pra mim.

– Deixe de ser assanhada. Vá fazer suas compras.
– Você me provoca depois me dispensa.
– Não quero provocar a ira da anã.

Dei mais um beijo nela e fiquei observando-a enquanto se afastava. Talvez ela estivesse certa. Precisava descansar um pouco, nem que fosse por meia hora. Antes que eu me levantasse a porta foi aberta novamente e Chay entrou.

– Bom dia,Arthur.
– Bom dia. Não me venha com más notícias, por favor.
– Não sou portador delas hoje. Felizmente.
– Antes isso. O que quer então?
– Só vim trazer alguns documentos.
– Do que se trata?
– Um carregamento que chegará daqui a quatro dias, um comerciante que busca segurança, o relatório do detetive… somente isso.
– Deixe tudo aí então. Eu preciso relaxar um pouco. Depois dou uma olhada.
– Algum problema?
– Não especificamente. Mas eu estou com uma sensação estranha. Não sei explicar.
– Ih… tenho medo de quando está assim. Sempre vem alguma bomba. – Dei de ombros e não respondi. Chay se levantou, percebendo que eu queria ficar sozinho.
– Vou indo. Mel está me esperando.
– Ela conseguiu tranquilizar o Micael ontem?
– Ah com certeza. Está tudo bem com Sophia e com o bebê.
– Melhor assim. Pode ir.
– Até mais.
– Até.

Fiquei olhando para os documentos, tentando me decidir se dava uma lida agora ou se ia para o quarto tentar descansar. Nem uma coisa nem outra. Novamente a porta foi aberta e a carinha ressabiada de Joseph apareceu.

– Pai? Estou atrapalhando?
– Desde quando você me atrapalha? Pode entrar. – Ele entrou com alguns livros debaixo do braço, parecendo extremamente sem graça.
– Algum problema?
– Não… quer dizer… sim. Er… eu preciso fazer uns exercícios. Mas está meio difícil. Pode me ajudar?
– O que está estudando?
– Matemática.
– Sente-se aí. Lógico que estudo com você. Matemática é meu forte sabia?
– Minha mãe falou.
– Então vamos lá.

Joseph arrastou a cadeira e sentou-se ao meu lado, espalhando os livros sobre a mesa. Sempre soube que era um garoto inteligente, mas não fazia ideia do quanto era esforçado. Não foi difícil conseguir faze-lo entender a matéria. Passamos horas estudando até que fomos interrompidos por um furacão que entrou no escritório, empurrando a porta que Joseph deixou entreaberta.

– Papai…

Lunna entrou correndo, um dos bracinhos esticados em minha direção, o rosto completamente lambuzado de alguma coisa escura que deduzi ser chocolate. Glenda entrou em seguida com John a tiracolo.

– Olhe se não é minha princesinha! O que andou aprontando hã? – Peguei-a no colo, livrando-me das mãos também sujas. Até mesmo a faixa que protegia seu braço estava lambuzada.
– Desculpe-me senhor Aguiar. Eu estava ocupado trocando o John e a Lunna quase devorou a caixa de chocolates de Lua. – Joseph riu ao meu lado apertando a bochecha da irmã.
– Agora você arranjou uma briga feia Lunna.

Lua não gostava de forma alguma que Lunna comesse essas porcarias. Porcarias que ela mesma, Lua, fazia questão de devorar quando estava nervosa. Mas Lunna puxou esse lado dela, e simplesmente adorava um chocolate. Aliás desconheço alguma criança que não goste. Eu me divertia vendo a briga das duas por causa de um pedaço do doce.

– Mas papai…
– Nada de mas. É melhor escondermos qualquer vestígio do seu “crime” antes que a mamãe chegue. Pode deixar Glenda. Eu e Joseph daremos um jeito nessa mocinha. – Levantei-me com Lunna no colo, mas imediatamente John estendeu os braços pra mim.
– Vamos lá… tem pai pra todo mundo aqui. Peguei John colocando-o no outro braço.
– Pode deixar comigo Glenda. Venha Joseph… vamos dar um jeito nesses dois.

Mesmo me distraindo com as crianças, eu não conseguia tirar de mim aquela sensação estranha. Eu sabia que algo estava para acontecer. Era sempre assim… meu faro não me enganava jamais.

***

Mãos pequenas e macias deslizaram pelo meu peito fazendo-me fechar os olhos por um instante, deliciado com o carinho inesperado. Inesperado porque já eram quase três da manhã e imaginei que Lua estivesse dormindo. Deixei minha cabeça pender para trás na cadeira e encontrei seus olhos preocupados.

– Algum problema?
– Nenhum. Por quê?
–Acordei e não te encontrei na cama. Você mal descansou Arthur… e eu conheço muito bem esses sinais. Alguma coisa está preocupando você.

Girei a cadeira ficando de frente pra ela e segurando-a pela cintura, coloquei-a em meu colo. Lua passou os braços em volta do meu pescoço, olhando em meus olhos.

– Sim… algo me preocupa. Mas sinceramente eu não sei te dizer o que é.
– Aquelas cismas de sempre? – Ela perguntou debochadamente.
– Não são apenas cismas e você sabe disso.
– Sei… e você sempre está certo. Sempre acontece alguma coisa… geralmente grave. E fico morrendo de medo por isso. Tem a ver com aquele traste?
– Não sei. É apenas uma sensação ruim. Talvez não seja nada demais.
– Talvez seja cansaço. Por que não vem pra cama?
– Eu irei daqui a pouco. Pode esperar por mim.
– Tudo bem. Mas não se demore.

Beijei sua boca rapidamente e em seguida ela se afastou. Apoiei o cotovelo sobre a mesa, passando a mão pelo rosto. Sabia que se fosse me deitar iria ficar rolando na cama. Ou então iria fazer amor com Lua até deixa-la exausta. E ela iria acordar em frangalhos. Melhor seria analisar os documentos que o Chay deixou. Talvez assim o sono chegasse.

Peguei primeiro o relatório do detetive. Nada de novo. Algumas pistas falsas e nada mais. Eu nem podia reclamar. Sabia muito bem da competência de Daniel e de sua equipe. O fato é que Dom Matteo realmente evaporou. E isso só me fazia ter a quase certeza que ele estava mais perto do que imaginávamos. Estava há tempo demais nesse mundo do crime pra saber que o improvável geralmente se tornava o quase certo.

Eu não baixava a guarda jamais. Sabia muito bem que Dom Matteo um dia viria até mim. Aliás… ele viria atrás da minha família. Seria bem mais interessante pra ele acabar com as pessoas que amo do que comigo diretamente. Passei novamente a mão no rosto e joguei o relatório para o lado. Estava me sentindo frustrado… fracassado. Felizmente os negócios estavam indo bem demais ou então eu iria pirar. Merda… merda… queria eu mesmo colocar as mãos naquele farabutto e arrancar seus olhos juntamente com suas bolas.

Peguei o outro documento. Informações a respeito do comerciante que buscava proteção. Embora esse assunto fosse tratado diretamente com Lua, eu sempre gostava de dar uma olhada antes. Havia muito velhote safado pronto para dar uma cantada em minha esposa. Isso já aconteceu uma vez. Um ser estúpido e provavelmente sem amor a vida deve ter se esquecido de quem era o marido de Lua. Obviamente além de não poder contar com minha proteção ainda levou uma bela surra. Afastei esses pensamentos enquanto analisava o pedido em minha mão.

Juan Xavier, espanhol, sessenta anos. Estava há pouco tempo na Sicília, menos de três meses. Seu negócio: pedras preciosas. Realmente ele precisava de segurança, se toda a fortuna informada fosse realmente verdadeira. Eu era o mais procurado do que os meus “rivais”. Simplesmente porque cumpria o que prometia. Está certo que meu preço era alto demais, mas os outros simplesmente extorquiam o dinheiro e não ofereciam serviço algum. Era meio contraditório para um mafioso cumprir com isso. Mas esse tipo de comportamento vinha desde os tempos do meu bisavô… e assim seguia até hoje.

Abri o notebook e enquanto esperava a tela abrir dei uma última olhada nos papéis. Juan Xavier… mesmo sendo novo por aqui, eu já deveria ter ouvido falar algo a respeito dele. Ouvi algo sobre joias mas na época não dei muita atenção. Acessei uma página de busca e digitei o nome do sujeito. Sem mais informações a respeito dele não havia chance alguma de permitir que Lua fosse até ele. Li atentamente as informações que apareceram na tela: Nascido em Madrid, os pais eram naturais da Inglaterra. Herdou todo o negócio da família. Era solteiro e não tinha herdeiros.

Continuei procurando até encontrar a foto dele. Tinha a pele bronzeada e os cabelos castanhos cacheados. As feições não deixavam dúvidas da sua naturalidade. Mas uma coisa me chamou a atenção e eu inclinei um pouco o tronco em direção à tela, observando minuciosamente seus traços. Fixei meu olhar nos olhos dele e prendi a respiração. Minha mãe sempre me disse que os olhos eram o espelho da alma. E eu sempre trouxe isso comigo. Era assim com Lua, por exemplo. Se eu queria resposta para alguma coisa bastava olhar em seus olhos. Por isso eu nunca me enganava quando fazia isso. As pessoas podem mudar praticamente tudo: nariz, boca, cabelos… mudar completamente as feições do rosto. Mas se tinha uma coisa que não tinha como mudar eram os olhos. Claro… poderia mudar a cor, usando lentes, por exemplo. Mas certas coisas eram imutáveis. E novamente as palavras da minha mãe vieram com força à minha mente: os olhos são o espelho da alma.

E estava bem ali… a prova viva desse ditado. O rosto me era totalmente estranho. Mas os olhos… aqueles olhos eu jamais esqueceria: frios, astutos, insanos… assassinos. O olhar de um monstro sem alma. Agarrei a tela do notebook, percebendo os nós dos meus dedos ficarem brancos e meu maxilar quase trincar. Falei entredentes, com raiva incontida.

– Peguei você… seu filho da puta.

Continua...

Se leu, comente! Não custa nada.

Com 10 comentários, eu postarei o próximo capítulo.

Obrigada pelos comentários do capítulo anterior.

Falta uns 4 capítulos, fora o epílogo para a fanfic terminar.

Estão ansiosos?

Beijos!

15 comentários:

  1. Caramba sera que é ele ansiedade a mil !!

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  2. PERFEITO continua please

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  3. Respostas
    1. Arthur não costuma se enganar, Karen! Acho que Dom Matteo tem que começar a correr... ou aprender a rezar.

      Capítulos "Booooowww" virão... Aguardem!

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  4. Eitaaaa!
    Faz uma segunda temporada 😢

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    1. Larissa, não tenho como fazer uma 2ª Temp. Pois a fanfic não é de minha autoria. Em outras palavras: Não sou a autora dessa história. Eu apenas tenho permissão para reposta-la.

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  5. Estou muito ansiosa! Não acredito que está acabando :(

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  6. O Arthur é duro na queda,fico impressionada com suas habilidades.A Lua nos negócios,melhor coisa.Amo essa fic,nem acredito que esta acabando.Milly, queria pedir desculpas,nao tenho comentado nos capítulos,mas é porque estáva em semana de provas e precisava estudar.Espero que perdoe a falta de comentários da minha parte e achei justo dar uma explicação,pois você sempre se justifica quando não atualiza as fics.Espero que entenda e desde já agradeço.Bjs.

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    1. Olá, Anninha! :-D

      Tudo bem, Anna... Eu entendo. Primeiro a escola, as provas. Isso é bem mais importante. Está desculpada haha relaxa! O importante é que agora você voltou. Não se preocupe com isso... É eu gosto de explicar... achei bom isso da sua parte também!

      Beijos!

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  7. Não acredito que já esta quase acabando,continua

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  8. Você escreve muito bem parabéns

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    1. "Anônimo" Fico feliz em saber que gosta da fanfic e da escrita em si. Mas não sou eu quem escreve essa história.

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  9. Lendo essa fic pela 3° vez e até hj fico arrepiada com esse capítulo kkkkk

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